18 de outubro de 2010

"À Deriva" no Diálogo Cinemático

O caminho pelo qual uma menina se torna adulta é quase uma alquimia: existe um fio tênue, mas decisivo, que separa um desejo paterno incestuoso de um olhar do pai que confira à menina a certeza de que ela é desejável como mulher. Contardo Galligaris

À Deriva será objeto do Diálogo Cinemático, projeto promovido pela Clínica de Psicanálise de Piracicaba, neste sábado (23/out.). Dirigido pelo pernambucano Heitor Dhalia, o filme retrata Filipa (a estreante Laura Neiva, 14 anos) em seu processo de ingresso na vida adulta. Durante as férias da família em Búzios, a adolescente, ao lado do pai escritor (Vincent Cassel) e da mãe com tendência ao alcoolismo (Débora Bloch), precisa lidar com questões como sexualidade, confiança, maturidade e liberdade para deixar a inocência juvenil para trás. O pano de fundo da trama é a crise conjugal dos pais, que leva à desarmonia familiar.

Como mediador do debate que se seguirá à projeção estará Heitor Amílcar, membro do Grupo de Estudos em Psicanálise de Rio Claro. Para ele, o filme estabelece em seu formato um contraste entre planos fechados, sempre com uma câmera bem livre, e os abertos (elaboradíssimos) que bem pode equivaler à também oposição entre o clima de férias, como que permanente (paisagem tropical idílica e corpos bronzeados), com a angústia do crescimento íntimo, vivido por Filipa.

Ao eixo central de À Deriva – a transformação da filha menina em mulher, passagem marcada pelo olhar do pai (em seu desejo) – cabe ser acrescido algo que perpassa a própria narrativa. O olhar de Filipa é o fluxo principal desse contar: as impressões dela tendem a dar efetividade aos fatos. Contudo, no filme, cada personagem acaba sendo constituído um pouco como culpado e um pouco como inocente, aliás, feito a vida de todos nós.

Assim, essa tendência de se enveredar, como é comum, pela impressão inicial leva, ao fim, à percepção de que, no mais das vezes, estamos é boiando, à deriva, posto ser a realidade composta também pela dinâmica e complexidade dos outros viventes. Nesse sentido, o conceito lacaniano de sujeito suposto saber e de sua concepção de psicanálise como ética podem ser tidos com abordagens mais difusas a serem capturadas nesse balouçante olhar sobre as emoções – próprias e as do outro.

Filme
: À Deriva, 1o7 min, 2009; dir.: Heitor Dhalia (Nina e Cheiro do Ralo); fotog.: Ricardo Della Rosa; com Laura Neiva, Vincent Cassel, Débora Bloch, Camilla Belle, Cauã Reymond e Gregório Duvivier
Sessão: 23/out. – sáb., às 15h
Local: Clínica de Psicanálise – R. Prudente de Moraes, 1.314 – Bairro Alto/Piracicaba
Inscrições gratuitas: mmariguela@gmail.com (vagas limitadas)
Foto: divulgação

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